Poesia Permanente

"a forma de escrever é provisória, a poesia é permanente" Rosa Lia Dinelli

O chacoalhar daquele ônibus velho que servia de transporte urbano, fazia aquela garotinha deitada no colo do pai que viajava sentado chacoalhar mais que as vidraças. Meus olhos a observavam meticulosamente. Ela dormia e exprimia expressões de angústias em seu rosto. Seria o sonho? Seria o barulho das vidraças das janelas? Seria o ronco do motor? As pessoas viajavam silenciosas, não poderia ser barulho de gente. Ainda havia uns dois ou três assentos. Seria o mundo?

Tão pequena e ignorante de tudo o que a cerca. Ela dormia, ou tentava. Vez por outra levantava sua cabeça entreabrindo falsamente os olhos como quem vai acordar. Mas apagava bêbada de sono no ombro do pai. Meus olhos continuavam a acompanhar toda aquela dança. Eles se perguntavam o que poderia estar passando naquela mente tão pequena e virgem desse mundo. Ainda de olhos fechados como quem dorme, ela chorava, soluçava e rapidamente entrava numa quietude sonífera espetacular. Era um espetáculo teatral improvisado da vida. Meus olhos filosofavam em meio a tanta cena. Seria apenas um comportamento típico infantil? Dois anos? Três anos? Quantos anos teria?

O pai se levantava com uma calma contrastante ao balançar do ônibus. Compassadamente como quem dança, para não despertar a menina; que mudava de expressões bruscamente. Aparentemente adormecida e angelical, ela mexia a cabeça no ombro, chorava e voltava a dormir... sonhar?!? Já de pé fez sinal para descer e foi pela porta da frente. Para ser mais cômodo ao sono da menina. Meus olhos se perderam da cena. Mas minha retina retinha tudo o que se passou.

Ela sonhava com o que viria. Acerca do futuro. Sonhava com o mundo e chorava. E inquietava. Dois anos? Três anos? Quantos anos teria? Todo um mundo enfeitado de fantasias. Quantos anos até que tudo se tornasse realmente real? Quantos anos até descobrir que ao passar do tempo melhor não mais chorar e apenas sonhar?

0 Reflexos Permanentes:

Seguidores