Poesia Permanente

"a forma de escrever é provisória, a poesia é permanente" Rosa Lia Dinelli

As palavras que ela falou

Não foram ditas

Foram proferidas

Pois a hora já chegou

*

Virar o disco

Deixar a vitrola rodar

Na rotação normal

Basta um botão apertar

*

A profetiza

Não é do mar

Não é do céu

É da terra

É sangue meu.

***

A tia Diomar

RJ/Galeão, 31122008

Todo homem tem seu vício:

O velho a sua dor

Seja onde for

A esposa de limpeza

Inclusive no pós mesa

O bom marido a serenidade

Mantendo o amor na eternidade

Os bons filhos a obediência

Para os pais manterem a paciência

*

Ao cientista a ciência

Para sempre descobrir

À criança a alegria eterna

Contaminando a outrém sorrir

Ao bom empregado a subserviência

Para suas necessidades suprir

*

todo homem tem um vício

Para seu suplício sanar

Para toda situação chata, paciência

E no ciclo do vício se afogar

*

Todo homem teu seu vício:

A dor seu sofredor

O poeta seu papel e caneta

O firmamento o sol, a lua e as estrelas

E as nuvens a passear

A solidão o cigarro amigo

A música suas notas e os ouvidos

E a eternidade o tempo

Para nunca terminar

E no infinito findar.

***

Guarujá/SP, 28122008

Da corbetura de um 4° andar

Vejo um pedaço de serra

A tempestade segura no ar

As vozes da rua adentro da janela

*

E meus pensamentos

Voando em sonhos a cultivar

Avistam do alto a vida de bem

Aterrissa da real dificuldade

Taxiando no pé de uma escadaria

Por qual degrau começar?

*

Eu vi o mar

Perdido nas linhas e entrelinhas

Da claustrofóbica caixa gigante

De concretos óbvios da atualidade

*

Aspiro e bebo venenos

Na busca de rimas que me faltam

A chuva cai fina em clima ameno

E tudo está no primeiro dito

E tudo está em nada

E está também no refrão.

***

Guarujá/SP, 26122008

Sem volantes na mão

Me dirijo a outro rumo

Em contra-mão

E a favor do pretérito

Eu sempre me dirijo

*

Com lenços e documentos

Me dirijo mais uma vez

Estradas nunca vistas

Em rumo a laços

Ainda desconhecidos (esse é meu rumo)

*

E eu sempre me dirijo

Sem volantes na mão

Sem conhecer bem os caminhos

Com aquelas únicas certezas:

Do peito pulsando e do desconhecido.

***

Rezende/RJ, Estrada pra SP, 22122008

As tempestades

São lágrimas guardadas

Rasgadas através do peito

Sangue salobro e transparente

Percorrendo o seio da face

*

Tempestades tambem são

Um espirro de anúncio

Que após tão turbulento prenúncio

De raios e sons intrigantes

Chegarão dias claros e radiantes

*

Eis um feixe

De um raio de sol que escapa

É um novo começo que chega

De um pedaço de caminho

Que acaba

*

Para toda porta fechada

Outras tantas abertas

Em qualquer janela há frestas

Saber apenas o certo momento

O qual se deve passar.

***

RJ, 20122008

Onde está o meu ventilador

Barulho rotineiro

Toda noite um acalanto

Na engenharia mecânica secular

*

Cadê meu celular

Que muito mais que falar

Era ouvir os meus arquivos prediletos

Companheiros eternos que não estão aqui

*

Para onde foi a minha vida

Ou o que já foi já não se é

Um livro de páginas viradas

Que não se pode rebobinar.

RJ, 181208

Minha roda gigante parou

E do topo do mundo

Eu vejo tudo

Às claras

Passado a limpo

De que a vida

É uma roda-gigante

Como a minha alma

Ora dá um giro

Ora tudo está em baixo

Ora tudo está em cima.

Rj, 18122008

As minhas casas são de campo

Eu me lembro

Eu me lembro muito bem

Que toda vez que eu chorava

Chovia, chovia

Tempestade de ilusões e pensamentos

E eu ia, ia

Pondo tudo no papel

*

As minhas tangas são de seda

Eu sentia

Eu sentia desde o berço

A leveza de meus movimentos

Eu sorria, sorria

De conforto do meu ser

De ser eu, eu

Devia ser pintor.

Rj, 12122008

Um fio de gás

Passa por minha cabeça

E minh'alma

Inebria-se do volátil

*

Toda concretitude

Se faz material

E me abraça

Transversal do tempo

*

Eu quero um bonde

Um monte bem alto

Onde nada se afogue

E que se um dia chover

São lágrimas de não sei o quê

Eu quero a fé dos imortais

Eu quero amar

*

Uma faísca dadaística

Atravessa a escuridão

Onde haverá tempo

Para tudo se analisar

*

Tudo ao meu redor

Se traduz em universo

Do recôndito mais particular

Onde guardo intacto o verbo amar.

Rj, 11122008

No chão dessa sala

De qualquer sala

Eu me chego

A um aconchego sóbrio

e inebriante do 1° tropeço

*

Eu esquento os meus olhos

Do frio das coisas

Que hão por vir

Protejo meus pés das brasas

Que hão de me calejar

*

E mesmo diante

De toda a sombra que houver

Me entrego, me jogo e mergulho

Em qualquer copo de água gelada

As penas nao se molham.

Rj, 10122008

Eu quero a fé

De um copo d'água no deserto

As pernas do mundo

Abraçando minha cabeça

*

Eu quero uma mente

De mentiras reveladas

As conversas em seus lugares

E um raio ao meu redor

*

Não quero asneiras

Nem brincadeiras vãs

Quero respeito

Nem quero desrespeito

À minha vontade dúbia

Quero a volúpia

De crer no que eu quiser

Na medida do possível

Não quero um sim

Muito menos um não dá mais

Eu quero paz.

Rj, 07122008

Quando as aves assobiam

Anunciando o raiar do dia

Um homem acorda

Anunciando seu despertar

Com um assobio matinal

*

Pela janela as árvores em frente

Avista os pássaros nos galhos contentes

E cá, no piso frio de madeira

Procura em si o melhor galho

É chegada a hora do primeiro salto!

Rj, 06122008

A solidão é um sopro frio

Qual clima abaixo de 20°

Um ser humano em meio a tantos

Nenhum outro em meio a pombos

*

Sobe qual lava fervente

Como água pós café

Desce quente de desejos controlados

Por uma partícula etérea

Nem vento, nem lava: letras.

Rj, 06122008

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