Poesia Permanente

"a forma de escrever é provisória, a poesia é permanente" Rosa Lia Dinelli

Quem era Virgínia? A irmã apaixonada pelo cachorro da cunhada. A filha da pederastia do pai com o tio. A colega apaixonada pela mãe da aluna, que por sinal era sua professora. A menina muda e nada surda que nas tardes após os deveres de casa ficava abaixo do fícus da praça ao lado de sua casa e escrevia o cheiro de seus cabelos; de forma a imaginar que todos iriam sentir o cheiro que as letras descreviam. Era a garotinha que abria a caixa de música que sua avó deixou antes de morrer, precedido de um beijo na boca, toda noite antes de dormir.

Quem era Virgínia? A adolescente que ia crescendo sem saber quem era e não fazia a menor noção de quem seria: apenas Virgínia até então. A menina que tragou seu primeiro cigarro aos quatorze anos e que aos dezessete ainda fumava calculando quantos dias passar com uma carteira de cigarros: no mínimo três dias. O máximo que ela conseguira fora dez dias. Ela também respirava antes de acender o cigarro e sempre dizia “mais um para uma morte lenta”.

Quem era Virgínia? A mulher que passou por todos os momentos possíveis e passou por todos. E que agora nada mais queria passar. Lia apenas seu diário com diversas descrições aromáticas de seu cabelo infantil; e sentia todos os cheiros profundamente. Inclusive o de feijão queimado. Era Virgínia, virgem, louca, sã, inconseqüente, calculista, metódica, mas ainda continuava muda e nada nada surda.

Quem era Virgínia? A velha no leito de morte a se olhar no espelho do seu quarto de asilo a se perguntar “quem não era Virgínia?”.

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