Poesia Permanente

"a forma de escrever é provisória, a poesia é permanente" Rosa Lia Dinelli

Alice sonhava que não sonhava. Tinha seus quinze anos vividos intensamente como quem viveu até os trinta e cinco. Até o que menos se possa imaginar. Mas sem o ato carnal das experiências. Sua vida se construiu ao lado de um pai viúvo com ideologia hippie e uma sapiência intelectualóide assustadora. Explica-se em Sr. Arnaldo toda a influência literária, musical, cultural, artística... em especial a pré-maturidade e o desejo de observar tudo.

Desde pequena, ainda quando Sr. Arnaldo era casado com D. Maristela, Alice mais via que ouvia seus pais sentados no chão da sala de poucos móveis a ouvir de Chico Buarque a Led Zepplin e Beatles. Via seus pais a ler de Chico Xavier a Sartre e Tolkien e depois correlacionar e interligar o coquetel literário. Assistir a teatro, shows... e foi num balet do grupo Primeiro Ato que Alice, em seus seis anos, despertou um desejo orgásmico em seu comportamento detalhadamente espectador. Aos sete, um ano depois de assistir a um balet teatral sobre Nelson Rodrigues, Alice congelou o seu voyeurismo.

Num barracão cultural próximo ao apartamento uma briga entre duas lésbicas que nunca freqüentaram o local, Alice viu uma garrafa de cerveja ser atirada ao léu bater numa pilastra se espatifando e um grande caco rasgar a jugular de D. Maristela, enquanto conversava sobre a vida com Sr. Arnaldo.

A primeira vez que Alice fechou os olhos para o sangue que jorrou em sua face dócil não o ruborizar a imagem do pescoço de sua mãe degolada.

Três meses depois, ela abre os lhos para o mundo e passa a senti-lo com a visão. Nunca..., nunca..., nunca trepou, nunca se drogou, nunca beijou ... mas viveu e sentiu todas essas experiências com os olhos. Sentada enquanto os outros faziam tudo. E o prazer orgásmico a preenchia completamente. E assim fora toda a sua vida. A única coisa que não via eram espelhos. O reflexo era irreal.

Aos 75 anos, passeando na praia, sozinha, despercebida, olhando para seus passos na areia, uma poça d’água revelou que o tempo passou e que ela nada fez. Mas viu. E isso não é vida para se ter. Alice morreu no dia seguinte ao ver seu reflexo na praia. Morreu dormindo, abraçada num espelho em cima de sua cama do quarto de vida.

[Inspirado em Talita]

1 Reflexos Permanentes:

lisongeada!


mas acho que preciso ser voyer de mim mesma para entender melhor a minha relação com alice...

enfim


texto aprovado!

gpstei bastante!

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